sábado, 14 de abril de 2012

Pagando pra ver

Acabei de ler uma HQ chamada "Paying For It". É a história real de um cartunista que decide que não quer ter mais namoradas e começa a fazer sexo apenas com prostitutas.

Depois de terminar um namoro e presenciar o novo relacionamento cheio de brigas da ex, Chester Brown percebe claramente que a ideia de amor romântico é um porre, causa mais dor do que alegria e quer pular fora desse barco. Ele defende que o sucesso dos relacionamentos são momentâneos pois as pessoas mudam - não necessariamente na mesma direção e isso é normal ("Me sinto uma pessoa diferente da que era há 10 anos e uma muito diferente da que eu era há 20 anos", exemplifica).

E aí o que sobra? Só chateação. Estar em um relacionamento amoroso sério não te garante sexo na hora que você quer. E se a única parte boa da relação é o sexo e você consegue sexo fácil fora de uma relação, pra quê ter uma relação?

A mãe de um dos amigos do tal cartunista fala que ele não tem respeito próprio ao saber que ele saiu com prostitutas. Chester diz que ao contrário do que pensam, se sente muito bem na vida e consigo mesmo e ainda argumenta: "Olha só o nosso amigo R, que acabou de levar um fora da namorada. Ele está péssimo tem muito tempo, ele está sofrendo. E porque ele está sofrendo? Pois ele foi rejeitado, pois ele precisa de alguém que esteja apaixonado por ele. Sem essa voz externa dizendo 'Te amo', ele desmorona. É por isso que pessoas precisar de relacionamentos, pois são inseguras. Precisam de alguém do lado de fora dizendo que elas são amáveis. Ou bonitas. Ou legais. Um cara com respeito próprio é um cara que não precisa estar num relacionamento [pra ser segura de si]". Interessante, não?

Pouco depois, ele conta aos amigos que deu uma de suas HQs para uma das prostitutas que ele vê. "Ela sabe o que você faz? Você conversa com elas?", perguntam os colegas. "Conversar - conhecer um pouco da moça - é um adicional à experiência. A faz parecer menos fria e impessoal", responde. E seu amigo recomenda: "Aqui vai uma ideia: se você quer ter uma experiência sexual que não é fria e impessoal, arranje uma namorada". Hum, touché.

O livro levanta várias questões interessantes sobre a invenção do romantismo ("no passado, era comum desenvolver afeto pela pessoa com quem você tinha se casado, mas amor não era motivo para casar. As pessoas casavam por dinheiro, status, famílias, acordos etc") e, mais para o final, começa até um debate sobre a legalização da prostituição - e de um ponto de vista que nunca tinha prestado atenção e que me surpreendeu.

No final, a mensagem é que cada um sabe da própria vida, cada um deve ir atrás do que acha certo para si - mas sempre é bom dar umas paradinhas no caminho pra ver se você está indo pro lugar que você quer ou pro lugar que estão te falando pra ir.

"Paying For It" não tem edição em português ainda, mas tem uma linguagem fácil, não é preciso ter um inglês afiado não. E vale muito a leitura, é um tipo de reflexão bem ímpar e, convenhamos, diferente. Muito do que é produzido atualmente pela indústria cultural é pra reforçar essas ideias de amorzinho e mimimi.

Mas o buraco é mais embaixo, claro. A gente lê essas coisas, entende, aceita, dá razão - mas não funcionamenos bem assim. É exatamente como Woody Allen diz em "Annie Hall":

O cara vai ao psicólogo e diz: "Doutor, meu irmão está louco; ele acha que é uma galinha". E o médico diz: "Bom, e porque você não interna ele?", e o cara diz: "Até internaria, mas preciso dos ovos".

Acho que é assim que me sinto sobre relacionamentos. São totalmente irracionais e loucos e absurdos. Mas a gente continua insistindo neles pois a maioria de nós precisa dos ovos.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Envelhecer, o elefante branco da comunidade gay


Em janeiro, um bem-sucedido terapeuta gay de Manhattan chamado Bob Bergeron cometeu suicídio. Sim, esse moço bonito da foto. Ele tinha 49 anos e estava prestes a publicar o livro “The Right Side of Forty: The Complete Guide to Happiness for Gay Men at Midlife and Beyond”. É, um livro de auto-ajuda direcionado aos gays com mais de 40 anos.

Sua filosofia era uma tentativa de convencer a si mesmo ou apenas uma maneira de ganhar dinheiro? Não sei. Mas muitos grupos gays são exageradamente baseados em beleza física e novidades, então acho que de qualquer forma vale a reflexão. Afinal, ao mesmo tempo que não devemos antecipar nossa velhice, não seremos jovens para sempre.

Nada contra quem fica por aí brigando sobre qual seriado de TV é melhor, gastando horas do dia decorando coregrafias de clipes ou na academia, gastando tubos de dinheiro em roupas e produtos tecnológicos da moda, mas espero sinceramente que essas mesmas pessoas estejam também buscando algo a mais da vida. Que elas queiram se conhecer mais, se desenvolver mais, compartilhar mais. Que reflitam um pouquinho sobre a vida, a morte, a efemeridade da existência. Ao contrário do que parece, pensar sobre isso não quer dizer ser obscuro, deprimido ou pessimista. Sair do armário para si e para o mundo pode ser muito doloroso, mas não quer dizer que a partir daí é só festa não.

O desafio mesmo - e esse não é só para os gays, claro - é conseguir ser feliz consciente da velhice, da doença, da morte e da solidão. Viver negando essas coisas é pra lá de fácil, existem vários jeitos. Mas, se negar essas coisas é a única maneira de você conseguir ser alegre, há algo errado. Não fica uma coisa meio falsa e histérica? Não cansa? Pois é. Fazer as pazes com a própria existência é o único jeito de estar satisfeito.

Satisfeito, pois "feliz" já seria uma palavra grande demais.